EQUILÍBRIO DE TROCA
Por: Bianca Pizzatto
EQUILÍBRIO DE TROCA
Nas relações humanas existem leis que as regulam. Uma delas é a Lei do Equilíbrio de Troca ou Equilíbrio entre o Dar e o Tomar. O desiquilíbrio em uma dinâmica de pares ocorre, quando uma pessoa doa muito e não recebe, enquanto a outra recebe e nada retribui. Exemplifico com um tema muito comum na relação de pais e filhos: a mesada. A mesada é uma forma de colaborar com a criança para que aprenda a lidar com o dinheiro. É um ato natural, visto que nesta fase da vida dos filhos os pais estão doando bastante e os filhos não têm como retribuir porque são crianças. No entanto, com o excesso de doação, os filhos recebem, como informação sistêmica, que eles “não são capazes” por si só, e acreditando nesta informação eles seguem sem conquistas próprias e, o pior, acreditando que os pais devem ser os responsáveis por satisfazer todas as suas necessidades. Aqui podemos falar também sobre o amor cego, aquele imbuído da intenção amorosa de proteger e cuidar dos filhos, fazendo de tudo para que eles não passem pelas mesmas privações ou dificuldades que os pais passaram.
Esse amor se difere do amor exigente, que ama e reconhece que para aprendermos a lidar com fracassos, frustrações e dificuldades, é importante as experiências, que os filhos precisam aprender que para toda ação existe uma reação. E como se sente o filho excessivamente protegido? Livre ou sufocado?Desta forma, vemos que no campo dos relacionamentos humanos, dos grupos sociais, quando alguém dá algo, o outro fica devendo e precisa retribuir para que haja equilíbrio. E a lei se aplica também na troca de ações, como a gentileza e a caridade entre as pessoas. A pergunta nesses casos é: a pessoa que recebe está retribuindo de alguma forma? Ela está grata e fazendo ações que compensem o recebimento? As ações podem ser simples como no caso da mesada, atribuir ao filho tarefas domésticas, algo que faça a pessoa recebedora se sentir merecedora e grata pela doação, retribuindo do seu jeito. O receber sem possibilidade de retribuir, degrada e enfraquece, fazendo com que a pessoa desmereça o que recebeu e aja com ingratidão, tentando inconscientemente inferiorizar quem deu demais para que ela saia da sua posição de superioridade e seja possível uma troca de igual para igual.Uma situação que comumente observo nos processos de divórcio e partilha de bens, são os casais que se divorciam e colocam o patrimônio no nome dos filhos, com cláusula de usufruto, como solução para a partilha. Este fato gera desordens e não raras vezes conflitos graves, afinal, não é uma doação concreta e os filhos são usados como âncora de solução e ficam incapazes de retribuir, mesmo porque não pertencem ao relacionamento de casal e não são partes no processo de partilha.
E falando sobre relacionamentos de casal, observo que quando um dá e o outro só recebe, isso gera uma tensão dentro da relação, uma vez que o formato da relação não é mais lado a lado, e sim de um é mais e o outro é menos, de que um é bom e o outro ruim, de que um sabe mais e o outro menos, e assim por diante. O que só recebeu ou recebeu demais se torna quase como um filho para o outro e o afastamento começa a surgir. E o que deu demais e espera uma retribuição, alimenta dentro de si uma reivindicação. É natural que esses sentimentos não revelados sejam exteriorizados através da raiva ou fuga. Raiva para diminuir o outro e igualar a relação, ou fuga para buscar um relacionamento onde o dar e o tomar possa estar em equilíbrio. E aqui não estamos falando de dinheiro. Em qualquer relacionamento de casal, é perfeitamente natural que um produza mais economicamente, execute mais tarefas domésticas, cuide mais dos filhos e assim por diante. A questão é encontrar nas funções um equilíbrio suficiente para que ambos possam se sentir leves, importantes e pertencentes ao sistema. Ou seja, aquele que recebe precisa retribuir dando alguma coisa e o que recebe volta a oferecer algo e assim o relacionamento cresce na troca de sentimentos ou atitudes, e, portanto, o vínculo se mantém fortalecido e abastecido.
Da mesma forma, o equilíbrio entre o dar e o tomar serve para os relacionamentos no trabalho. Podemos falar do patrão que dá muito e cobra pouco, do empregado que executa demais e recebe de menos. Em algum momento os elementos da relação sentem a tensão e os papéis já não são mais de uma relação de trabalho, podendo se configurar tanto em uma relação de pai e filho, como até mesmo em uma relação de escravo e carrasco. E os sentimentos que surgem a partir desse novo formato vão depender das crenças e memórias individuais.
A questão é que nessa relação desequilibrada não se trata mais das regras de uma relação de trabalho. Um bom patrão é aquele que contrata um funcionário para executar tarefas claras e que pague por esse serviço um salário adequado, contratado e justo. Quero dizer, se o empregador contrata um funcionário para trabalhar 8 horas por dia por um salário X, o desequilíbrio acontece se o empregado trabalhar com frequência 10 horas por dia e continua recebendo X, sem o acréscimo das horas extras.
O desequilíbrio, provocado pela quebra das regras no dar e tomar, provoca tensão incapaz de sustentar o relacionamento. Assim também se o empregado não cumpre o horário e não executa as tarefas com excelência, ao receber o salário integral, como se cumprisse todas as regras, faz surgir o desequilíbrio. E a tensão é ainda maior se esse empregador passar a dar coisas além, sem que o empregado possa de alguma forma retribuir esse acréscimo.
E por falar em relacionamentos profissionais, interessante olhar para a relação cliente-advogado. Identificar na linguagem do cliente a sua necessidade, evita dissabores provocados não raras vezes, pelo desequilíbrio no dar e tomar. Alguns clientes têm o hábito de transferir para o advogado a cobrança que deveria ser direcionado à outra parte envolvida e assim, querem do advogado mais do que ele está disponível para oferecer. Advogados facilitam soluções para os conflitos, são indispensáveis para a justiça e exercem atividades de meio, não de resultado. O resultado, o melhor resultado, está no sistema do próprio cliente. Ou ele ou a parte contrária tem a solução.
E o cliente em equilíbrio acolhe também a estrutura do poder judiciário, reconhecendo suas falhas e deficiências, e não transfere para o advogado a sua dor, frustração ou raiva pela demora na prestação jurisdicional. Esse cliente toma do advogado aquilo que lhe cabe, porque o profissional soube dar e tomar de forma justa e equilibrada. É importante mantermos a postura profissional, acolhendo o cliente, vendo as partes e os elementos de seu conflito, mas utilizando para isso os recursos e ferramentas que temos disponíveis. E nesse sentido, por experiência profissional, alerto para o uso das constelações familiares no exercício profissional da advocacia. Não se trata de uma técnica aprendida simplesmente nos livros e cursos. Quando o profissional não tem segurança, permissão interna e profundo conhecimento teórico e vivencial das leis sistêmicas, corre-se o risco de o advogado transformar-se em conselheiro ou terapeuta. O advogado tem postura sistêmica e competência para utilizar as ferramentas sistêmicas na facilitação de uma solução, mas ele não é um terapeuta e nem um constelador. E quando o advogado além de consultor jurídico e procurador do cliente, se transforma em terapeuta, é consequência natural que a relação fique desequilibrada pela própria natureza da contratação e pelas regras do jogo estabelecidas, na qual o cliente está retribuindo financeiramente apenas os serviços do advogado.
Por último, vou falar dos relacionamentos sociais como a amizade. Inicialmente o que une dois amigos são as afinidades. Somos atraídos pela empatia que nutrimos por alguém a partir dos nossos canais de comunicação. No entanto, esse gostar por si só é insuficiente para manter uma amizade em equilíbrio. No relacionamento entre amigos há mais do que o ato altruísta e generoso de oferecer aos amigos lembrancinhas de viagens, jantares e atenção. Receber é um direito e uma necessidade que alimenta a relação. Em um relacionamento positivo e com reciprocidade ambos estão disponíveis para a amizade e ambos se sentem livres para dar e tomar. A comunicação é respeitosa, prazerosa, leve para ambos os lados. Se um dos lados tem como amigo uma pessoa gentil e generosa, mas retribui de forma grosseira e egoísta, a amizade pode até durar um certo tempo, e até muito tempo caso essa relação envolver sobreposição de contextos pessoais, mas, certamente não é um relacionamento saudável e equilibrado. Claro que, ninguém é obrigado a dar o que não tem, no entanto, se essa pessoa toma muito, usufruindo apenas das benesses da amizade, esse relacionamento tende a ficar tenso, desconfortável e difícil para uma ou para as duas partes. E aqui, não se trata de culpados e inocentes, uma vez que podemos dizer que quem dá demais, às vezes, não sabe tomar. Logo, não se trata de que o recebedor não saber dar, mas sim, do doador não saber receber. Aqui falamos do equilíbrio para uma amizade positiva e duradoura.É muito linda a teoria do “dar sem receber nada em troca”. No entanto, uma coisa é caridade e benevolência, outra coisa é relacionamento. Em um relacionamento o equilíbrio de troca é uma lei sistêmica. Imaginemos que em uma relação, cada um de nós tenha uma bacia, e durante o relacionamento fossemos enchendo de coisas. Se uma bacia com o tempo permanecer cheia até o topo e a outra vazia, quais os sentimentos que brotam? O que carrega a bacia vazia se sente prejudicado, injustiçado e com sentimento de reivindicação. O que carrega a bacia cheia se sente pesado, carregado, cansado e com sentimento de querer dar algo para se aliviar.Quer um relacionamento saudável e positivo? Observe a lei do dar e tomar. Não cobre muito e nem pouco, não exija mais do que outro pode dar e nem ofereça pouco e nem muito. Para que um bolo cresça e fique saboroso, não basta amor, normalmente você segue uma receita, medidas mais ou menos equilibradas, mesmo que seja de cabeça. O relacionamento entre pares de certa forma também precisa de medidas certas e adequadas para crescer e ser saborosamente feliz e próspero.Vamos lá, praticar a arte de construir e manter bons relacionamentos.
Bianca Pizzatto
Advogada desde 1992 posso dizer que encontrei meu propósito de vida nas Constelações. Atualmente me sinto realizada como advogada, consteladora e professora.
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